Uma menina de 10 anos engravida. Seu tio a vinha estuprando há quatro anos. A família desconhecia. Infelizmente, esse não é um caso isolado. Quantos casos como esse, que veio à tona esta semana no Espírito Santo, não aconteceram ou estão acontecendo diariamente? A menina manifestou o desejo de interromper a gravidez, como permite a Justiça. Inclusive, o juiz Antonio Moreira Fernandes autorizou para seja feita “análise médica quanto ao procedimento”, atendendo a um pedido do Ministério Público. A OAB também saiu em defesa dos direitos desta criança.
Sou fundador do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca) e lido com situações semelhantes há quase 30 anos. Continuo me indignando profundamente com esse tipo de violência. Em situações como essa, minha posição sempre será de apoio à realização do procedimento, caso seja esse o desejo da vítima. É uma criança. Foi abusada. Corre riscos, já que com 10 anos seu corpo ainda está em formação. Também, teria a vida marcada por um ato de violência. Um monstro a estuprou. Gravidez infantil é tortura, nega direitos, interrompe o futuro e expõe a criança a outras formas de vulnerabilidade. Além disso, a mortalidade materna é maior justo na faixa etária entre 10 e 14 anos.
Mas, o que esse caso nos chama a atenção é a necessidade de os pais, parentes e até amigos e vizinhos estarem atentos para situações similares. O “monstro” que vinha abusando da criança desde os seis anos de idade tinha a liberdade de ficar sozinho com a menina e não levantou suspeitas, usando de ameaças para manter o silêncio da garota.
Certamente, existiram sinais de que os abusos aconteciam e as pessoas próximas não os detectaram. Na lida com crianças em situação de vulnerabilidade através do Cedeca, tive acesso a diversas situações envolvendo estupros. As crianças normalmente ficam assustadas, intimidadas, reduzem o convívio, emudecem. Não quero apontar culpados, mas os pais e parentes mais próximos devem estar sempre atentos. Sabemos que vivemos em uma sociedade contaminada, sem limites, muitas vezes fruto da impunidade e descrença na justiça.
Vamos esperar que esse criminoso, hoje foragido, seja preso, julgado, condenado e cumpra a pena pelo grande mal que causou; e que a criança possa ser cuidada e ter de volta sua infância.
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Waldemar Oliveira é Coordenador executivo licenciado do Cedeca