“Honesto, bom e bem educado”. Garanto que você pensou que estamos fazendo referência a predicados de uma pessoa. Nada disso. Estamos falando do Jornal A Tarde, apontado como “marco do ´jornalismo moderno` na Bahia” e da intenção expressa por seu criador, o político e jornalista Ernesto Simões Filho, na edição de estreia do periódico, em 15 de outubro de 1912.
Primeiro jornal da Bahia a publicar um anúncio com fotografia, A Tarde produziu inovação na publicidade, graças aos recursos gráficos de melhor qualidade, e em 1913, segundo noticiava em seu caderno, divulgou ilustração fotográfica do filme Um Salto da Morte, registrando mais a imagem da visita de atrizes de Sodoma e Gomorra à oficina de composição na sede da Praça da Sé, caracterizadas de personagens da produção.
Forjado em base financeira autônoma de Ernesto Simões Filho, descendente de família abastada, dono de terras, “o caçula dos jornais” suscitou a insatisfação dos demais veículos de imprensa, implementando a venda de espaços publicitários que denominou de “populares” para empresas privadas, instituindo, com isso, as bases dos atuais “classificados”. O episódio expõe os conflitos entre modernidade e conservadorismo na Bahia nas primeiras décadas do século 20. Ao contrariar a prática da cessão gratuita de espaços, culturalmente empregada pelos demais “donos da mídia”, a experiencia provocou discussões que se elevaram a ponto de Simões Filho ser chamado de “jornalista de balcão” pelo diretor do Jornal Manhã.
Ana Spannenberg, jornalista e professora do Curso de Jornalismo da Universidade Federal de Uberlândia (https://jornalgrandebahia.com.br/2012/10/) em suas narrativas historiográficas, termina por provocar a constatação do engajamento do jornal baiano nas campanhas políticas, com adesão aberta a candidatos que representassem seus interesses e evidentemente, os das classes dominantes.
Na Primeira República, A Tarde teve destaque à frente dos órgãos de imprensa insatisfeitos com o governo elitista e com a precariedade dos serviços essenciais, somada à crise epidêmica de varíola que deixou um rastro de mortes. Além de greves inspiradas por movimentos populares, o interior do Estado também se insurgiu, colocando os denominados “levantes sertanejos” nas Pautas principais de jornais da capital. A Tarde, lá estava, com sua bandeira de jornal “digno”, apoiando os revoltosos que aclamava como heróis. Exemplo desse “fervor político” foi a cobertura da Revolta Sertaneja quando A Tarde teria exercido duplo papel: “insuflador dos coronéis do sertão e aterrorizador da população da capital”.
E foi por esse trajeto histórico entre a liberdade e a opressão que A Tarde chegou a março de 1964, alinhando-se à grande imprensa nacional na formulação da enxurrada de conteúdos que insuflavam a população contra o Presidente João Goulart, apontado como um perigo e uma possibilidade de implantação de uma Ditadura Comunista no Brasil. Com isso, é inegável a contribuição da imprensa ao apoio civil para legitimarem o golpe. A Tarde não só aderiu à campanha de desestruturação de João Goulart, como apoiou os militares e sua intervenção no governo democrático do país. (Ana Carolina Rodrigues dos Santos Souza (https://br.search.yahoo.com/).
Fato a considerar é que A Tarde transitou sempre por regimes políticos tensionados pelas próprias contradições da sociedade, e assim, continuou a se destacar por suas inovações tecnológicas e a praticar o “jornalismo convergente”, entrando na era digital com estatura de formulador de opiniões de fôlego para manter sua categoria de jornal com a maior circulação no Nordeste.